FALTA DE RECONHECIMENTO, PROFESSOR E INTELECTUAL
Gérard Lebrun foi procurado por Michel Foucault para fazer uma revisão do que viria a ser a sua obra mais importante, “As Palavras e as Coisas”. O próprio Lebrun escreveu muitos livros importantes. Ele dava aulas tanto na França como no Brasil (na USP). Era um intelectual bastante respeitado.
Em 1996, porém, um episódio mudaria a sua vida: foi acusado “sem provas” de pedofilia (Veja, 10-05-2000). Escrevendo sobre o filósofo, João Pombo Barile afirmou:
“Assim, as capelas literárias jornalísticas se esqueceram da importância que o trabalho de Lebrun teve para o provinciano mundo intelectual da São Paulo dos anos 1960, e preferiram tornar o nome de Lebrun nacionalmente conhecido como um perverso pedófilo.”*
Não seria o primeiro caso que a imprensa brasileira, sem provas e no intuito de vender jornais, inventaria a sua própria versão para a história e fizesse o seu julgamento público. José Arthur Giannotti escreveu que Lebrun não contava que
“(…) a imprensa em geral, pontilhada de jornalistas que tinham sido seus alunos e seus leitores, fizesse coro a essa acusação.
(…) Na medida em que a imprensa transformou seu caso numa notícia dotada de vida própria, por conseguinte independente do que havia acontecido, barrando além do mais qualquer interpretação alternativa, Lebrun se via esmagado pelas engrenagens perversas dos moralistas do espaço público brasileiro. Todos muito amigos, todos tão covardes que só podiam repetir a versão consumada.”**
Gérard Lebrun voltou para a França e “tentou esquecer o Brasil.”** Entretanto, isso não foi possível. “Amigos mais próximos, afirmaram na época de sua morte, em 1999, que ele jamais se recuperaria da mágoa que o episódio lhe provocou.”*
Deve ser considerada, no caso, a falta de rigor da imprensa brasileira, principalmente em relação ao Gérard Lebrun, um conhecido intelectual que havia sido, inclusive, professor de alguns jornalistas que repetiam a história. Devem ser destacadas ainda a omissão e covardia de amigos que também preferiam repetir a versão dos jornais ao invés de lembrar da conduta prática de Lebrun.
Imagina-se que os indivíduos que conhecem a prática de um professor pelo menos procurariam pesquisar mais sobre o assunto antes de reproduzir a primeira versão do fato, especialmente se for levado em conta que eles foram alunos do docente. É importante considerar que não havia provas concretas contra Lebrun. Havia só o discurso de alguém que ele via como amigo (apesar da diferença social). Lebrun não poderia imaginar
“Que esse rapaz o acusasse de encomendar fotos de sexo com meninas, entenderia que isso estava no horizonte de um pobre acuado, que transfere para o amigo ‘rico’ e famoso a responsabilidade de seu crime.”**
Gérard Lebrun, na época, era assumidamente homossexual. Ou seja, “Do ponto de vista do objeto, a acusação era ridícula, pois todo mundo sabia que não se interessava por ninfetas.”**
É possível acontecer uma injustiça na vida de qualquer pessoa. O que causa dor, no entanto, é saber que aqueles que eram considerados amigos, que conviviam com o indivíduo, que conheciam os seus atos, participavam da sua vida, de repente, trocam tudo pela conveniência de não aparecer associado ao colega que foi, de maneira equivocada, condenado pela imprensa e pela opinião pública.
(*) João Pombo Barile. Silêncio estranho em relação a Lebrun. O Tempo, 14-10-2006.
(**) José Arthur Giannotti. A via da imprudência. Folha de São Paulo, 09-01-2000.
Gérard Lebrun foi procurado por Michel Foucault para fazer uma revisão do que viria a ser a sua obra mais importante, “As Palavras e as Coisas”. O próprio Lebrun escreveu muitos livros importantes. Ele dava aulas tanto na França como no Brasil (na USP). Era um intelectual bastante respeitado.
Em 1996, porém, um episódio mudaria a sua vida: foi acusado “sem provas” de pedofilia (Veja, 10-05-2000). Escrevendo sobre o filósofo, João Pombo Barile afirmou:
“Assim, as capelas literárias jornalísticas se esqueceram da importância que o trabalho de Lebrun teve para o provinciano mundo intelectual da São Paulo dos anos 1960, e preferiram tornar o nome de Lebrun nacionalmente conhecido como um perverso pedófilo.”*
Não seria o primeiro caso que a imprensa brasileira, sem provas e no intuito de vender jornais, inventaria a sua própria versão para a história e fizesse o seu julgamento público. José Arthur Giannotti escreveu que Lebrun não contava que
“(…) a imprensa em geral, pontilhada de jornalistas que tinham sido seus alunos e seus leitores, fizesse coro a essa acusação.
(…) Na medida em que a imprensa transformou seu caso numa notícia dotada de vida própria, por conseguinte independente do que havia acontecido, barrando além do mais qualquer interpretação alternativa, Lebrun se via esmagado pelas engrenagens perversas dos moralistas do espaço público brasileiro. Todos muito amigos, todos tão covardes que só podiam repetir a versão consumada.”**
Gérard Lebrun voltou para a França e “tentou esquecer o Brasil.”** Entretanto, isso não foi possível. “Amigos mais próximos, afirmaram na época de sua morte, em 1999, que ele jamais se recuperaria da mágoa que o episódio lhe provocou.”*
Deve ser considerada, no caso, a falta de rigor da imprensa brasileira, principalmente em relação ao Gérard Lebrun, um conhecido intelectual que havia sido, inclusive, professor de alguns jornalistas que repetiam a história. Devem ser destacadas ainda a omissão e covardia de amigos que também preferiam repetir a versão dos jornais ao invés de lembrar da conduta prática de Lebrun.
Imagina-se que os indivíduos que conhecem a prática de um professor pelo menos procurariam pesquisar mais sobre o assunto antes de reproduzir a primeira versão do fato, especialmente se for levado em conta que eles foram alunos do docente. É importante considerar que não havia provas concretas contra Lebrun. Havia só o discurso de alguém que ele via como amigo (apesar da diferença social). Lebrun não poderia imaginar
“Que esse rapaz o acusasse de encomendar fotos de sexo com meninas, entenderia que isso estava no horizonte de um pobre acuado, que transfere para o amigo ‘rico’ e famoso a responsabilidade de seu crime.”**
Gérard Lebrun, na época, era assumidamente homossexual. Ou seja, “Do ponto de vista do objeto, a acusação era ridícula, pois todo mundo sabia que não se interessava por ninfetas.”**
É possível acontecer uma injustiça na vida de qualquer pessoa. O que causa dor, no entanto, é saber que aqueles que eram considerados amigos, que conviviam com o indivíduo, que conheciam os seus atos, participavam da sua vida, de repente, trocam tudo pela conveniência de não aparecer associado ao colega que foi, de maneira equivocada, condenado pela imprensa e pela opinião pública.
(*) João Pombo Barile. Silêncio estranho em relação a Lebrun. O Tempo, 14-10-2006.
(**) José Arthur Giannotti. A via da imprudência. Folha de São Paulo, 09-01-2000.